A fragilidade emocional de nossos adolescentes

Filhos
09.out.2018

O que vem acontecendo com a adolescência hoje, antes tão romantizada? Terapeutas especialistas em adolescentes tem declarado que os notam tristes e desencantados, mais ansiosos e sombrios. Preocupados com um futuro incerto e um ambiente mundial instável, eles parecem se refugiar cada vez mais no isolamento. Muitos se mostram descrentes em relação à política e às relações amorosas. Álcool e drogas mais ou menos pesadas sempre tiveram o papel de desinibir, liberando os jovens das convenções e interdições. Mas o consumo de drogas está se tornando cada vez mais precoce, e há muito não discrimina o sexo.  O consumo generalizado traz o risco de ocorrer a evolução, nos mais vulneráveis, rumo a um comportamento efetivo de adição.  Para a maioria, felizmente, trata-se somente de um dos “ritos de passagem,” que lhes possibilitam canalizar a intensidade de um momento onde a sexualidade e as angustias existenciais emergem.

Muitos pais, mesmo sofrendo pela dificuldade de se “conectar” com seus filhos, tentam nesse período minimizar o distanciamento e fazer de conta que nada de anormal está acontecendo. Por acreditarem que não podem nem ajudar, nem fazer nada para interferir, apenas fecham os olhos e torcem para que tudo “passe logo.” A questão é que vai demorar bastante para “tudo passar” e o jovem se equilibrar: a adolescência é hoje um período que se prolongou e não dura mais três ou quatro anos, mas dez, no mínimo. É claro que contribui para isso o atual panorama sócio econômico e a dificuldade de entrada no mercado de trabalho, retardando a autonomia da atual geração. Mas hoje, recentes progressos em neurociências já confirmaram que o cérebro não se desenvolve apenas nos primeiros anos de vida, e sim se modifica e evolui por muito mais tempo. Entre os 15 e os 25 anos ocorre uma destruição neuronal seletiva, na região cerebral que se encarrega das funções cognitivas mais elaboradas. Esta “poda” é que vai acelerar tanto a transmissão, como o refinamento da informação, propiciando ao indivíduo uma melhora notável em suas funções cognitivas e performance emocional, dizem pesquisadores do assunto. Tudo isso para dizer que, na adolescência, muitas funções cerebrais ainda engatinham, como a  capacidade de decidir, de planejar e organizar suas tarefas. isso faz muita diferença no dia a dia.

E o papel do ambiente em que o jovem foi criado, será que influi na fragilidade emocional dos jovens da atualidade? É fato conhecido que adolescentes que tenham sido expostos a disfunções relacionais ou afetivas correm o risco de não saberem interpretar suas experiências. Isso é muito ruim: se algo não atende às expectativas exatamente, será percebido como uma derrota, por exemplo.  Dificuldades de se comunicar também ocorrerão mais, e serão mais difíceis de serem superadas, quando o adolescente for criado por pais ausentes, de pouco falar ou severos demais. O adolescente “médio,” aquele que não passou por tantas intercorrências negativas, ao seguir seu caminho em direção à idade adulta, vai administrar melhor suas derrotas, em suas tentativas de camaradagem profissional ou escolar, de amizade, ou investidas amorosas. Elas vão se frustrar, mas sem sofrimento excessivo. Por outro lado, insucessos serão motivo de grande angústia nos mais vulneráveis.

E os grupos, que sempre ajudaram, seriam ainda uma saída segura para suportar esse período de transição? Nem tanto. Não existem mais muitos lugares ou situações de socialização para os adolescentes. Nas noites em que se reúnem para beber e, eventualmente, consumir outras substâncias, eles não passam apenas por momentos de embriaguez e de, digamos assim, degradação coletiva pelo “passar mal”, com todas as ocorrências de intoxicações agudas, vômitos, pré coma alcoólico, etc. Eles parecem viver também uma experiência catártica, de troca de emoções, de dúvidas em torno de valores e de interrogações, que não conseguem expor em seu dia a dia. Com a desinibição a troca se torna possível, numa sociedade onde, nessa idade, falar do que se sente realmente o coloca em risco de provocar zombarias. A transgressão, concluem alguns especialistas, não se caracteriza mais como se rebelar contra a interdição, o proibido de tempos atrás. Hoje, ela poderia ser entendida muito mais como se expor ao ridículo da autenticidade de seus sentimentos.

Mesmo sem concordar com tudo o que pensam os pesquisadores, será que alguém ousa dizer, ainda, que os 20 anos são a idade mais bela da vida? Complicado, não?

 

 

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