Convivendo com as diferenças

Comportamento
10.fev.2015

Quem, de sã consciência, ainda acredita que conseguimos enxergar qualquer realidade tal como ela é? Atualmente,  especialistas no estudo da diversidade humana afirmam: uma das coisas que nos impedem de viver bem em comunidade é a nossa  reconhecida incapacidade para perceber a realidade tal qual ela é. Ou seja, para melhor viver em comunidade, precisaríamos abandonar nossos medos e ter a disposição de enfrentar, em nosso íntimo, os pontos de vista alheios que tanto nos incomodam. Um mergulho para dentro de nós, buscando o porquê do incômodo.

Em que se baseiam eles, para fazerem tal afirmação? Não estariam equivocados?  Não, e por uma questão até bastante simples, mas que pouco paramos para refletir.

A questão é que interpretamos os fatos que observamos ou nos são apresentados através de “filtros” adquiridos ao longo de nossa historia pessoal. Conforme tenhamos sido apoiados, cuidados, ou agredidos, maltratados e também dependendo do grupo social em que tivemos origem, seguiremos uma lógica que nos seja própria. Ela nos levará a nos identificar com os fortes e a desprezar os fracos, por exemplo. Ou o inverso.

Assim, qualquer que seja o assunto, sempre haverá um campo para tratarmos de incriminar um grupo (os poderosos, por exemplo) e correr em socorro de outro – no caso, os oprimidos. Ou vice-versa, dando razão aos primeiros e culpando os segundos. Esta lógica maniqueísta nos coloca num universo que se reduz a perseguidores e perseguidos. As diferenças ficam estigmatizadas e estanques, e os pensamentos de cada grupo não chegam a se tocar nunca.

Podemos afirmar que todos somos  afetados pelos pré julgamentos. Quantos serão os assuntos sobre os quais não temos conhecimento algum mas que, mesmo assim, sustentamos uma opinião, a priori? São ideias que não nasceram de nossa elaboração mental, mas foram “importadas” já prontas por nós. Vieram dos círculos aos quais pertencemos, como nossa família, nosso grupo social, nosso meio profissional. O resultado final é que nossos pensamentos ficam carregados de pré julgamentos, de propaganda e de normas sociais as mais diversas.

Costumamos pensar em consonância com o que pensam as pessoas que idealizamos. Ou então, pensamos contra as ideias delas, numa forma de reagir à influência que exercem sobre nós. De todo jeito, permanecemos dentro da ideologia que adotamos, e tentamos excluir da nossa  realidade os elementos que podem ser perturbadores em relação à nossa visão de mundo.

Para o mundo à nossa volta, seria benéfico se começássemos a tentar compreender nossas formas de pensar. Somos nós mesmos nos manifestando naquele contexto? Ou estamos apenas tentando defender nosso grupo, em vez de expressarmos nossa verdadeira opinião? Que rejeição tememos, caso venhamos a exibir uma forma de pensar autônoma?

Viver junto ou em conjunto é conseguir fazer parte de um universo onde as pessoas não estão todas de acordo, nem tem todas os mesmos pontos de vista. E, se tivermos interesse em melhor viver em comunidade, vamos precisar abandonar o medo das diferenças ideológicas e   enfrentar, dentro de nós, os pontos de vista que nos perturbam. Tentar compreender de onde vem determinado  pensamento, ver o que podemos mudar, em nossos argumentos ou em nossas opiniões. Tudo para chegar, quem sabe, a uma visão mais justa e mais global das coisas.

assinatura_simone

 

Artigos relacionados

10 abr

Somos o que temos?

De algum tempo para cá, nos acostumamos a ouvir que, nesses dias em que vivemos, “as pessoas são o que tem”. Repetido à exaustão, o comentário banalizou-se, passou a ser usual, e não causa mais impacto. Então, somos o que temos?? Ou, por vezes, o que aparentamos ter? O que isto quer dizer mesmo? De […]

  • 8402
Comportamento
10 jan

Sobre a intensidade da vida

Todos nós sonhamos com a intensidade em nossas vidas, idealizando o que é intenso como “o melhor”. Só que, parando rapidamente para pensar, vamos nos dar conta que não há intensidade a não ser pelo contraste. Tive um professor que gostava de repetir que ninguém sobreviveria a um concerto, se a música tivesse somente momentos […]

  • 1815
Comportamento
19 jun

A certa altura da vida

A certa altura da vida, já nos deparamos com a finitude (ou, falando de forma mais simples, com o fenômeno da passagem do tempo e a morte) algumas vezes. Dentro de nós já há o registro do valor do tempo, aprendemos o quão rapidamente ele passa. Com um pouco de atenção, passamos a perceber a […]

  • 2320
Comportamento